Devo, não nego, pago quando puder. Isso é crime?

A frase acima, conhecidíssima de todos, é bastante utilizada por aqueles que tem algum tipo de dívida, e estão com dificuldade de pagar. Em meio à crise econômica, e tendo inúmeros compromissos para honrar, as pessoas físicas e jurídicas acabam tendo que “escolher” o que quitar ao final do mês, terminando por sacrificar algum credor, que pode ser o Banco, Fornecedor, ou mesmo o Fisco. Mas nestas situações há o pleno conhecimento de quem e do quanto se deve, cabendo ao credor o direito de cobrar, e se este for o Fisco aí nem se trata de direito, mas sim de um dever. Ocorre que, embora qualificada como uma relação de direito, a relação jurídico-tributária atualmente vem se estabelecendo em clima de absoluta tensão, tendo, de um lado, o insaciável apetite arrecadatório dos Governos, péssimos gastadores dos dinheiros públicos, e de outro lado o contribuinte, suportando pancadas tributárias desferidas diariamente e quase sem forças para aguentar. O resultado deste quadro latente de conflito de interesse é o acirramento desta disputa, cabendo ao Fisco a criação de todo tipo de estrutura para garantir o recebimento de seus créditos. Os Governos são os maiores devedores, mas para eles nada acontece, eternizando os pagamentos de suas dívidas via precatórios, e muitos credores acabam “morrendo” sem receber. Já para os devedores tributários não há qualquer condescendência e são tratados como marginais, criminosos da pior espécie, e muitas vezes isto acontece por conta de dívidas declaradas e até parceladas, mas que, por razões financeiras, não puderam ser pagas. Aqui na Bahia, por exemplo, foi criada a figura do “devedor contumaz” (criação da Lei nº 13.199/2014), onde se enquadra aquele que simplesmente declarar seu imposto e não pagá-lo, por 03 (três) meses consecutivos ou alternados. Basta isso para ser considerado “devedor contumaz”. O contribuinte que foi correto, declarando ao Fisco tudo que devia, mas que não pode pagar seu ICMS por 03 (três) meses, é considerado “devedor contumaz” e contra ele acontecerá, por exemplo, o Regime Especial de Fiscalização, onde os Auditores cobram o ICMS em tempo real, diariamente, conferindo todas as entradas e saídas dos produtos daquele devedor, com plantões permanentes, turnos de 24 h, verificando estoques, caixa, e submetendo o contribuinte a esta vexatória situação, constrangendo-o. E tudo isso por que ele declarou, confessou a sua dívida tributária. O vizinho dele, que não declarou e nem pagou, nada sofre. Mas não é só isto. Para o “devedor contumaz” o Fisco Baiano também está aplicando a mais severa das penas, que é a INAPTIDÃO de sua inscrição estadual, resultando na completa inanição da empresa, que nada mais poderá comprar, pois ninguém vai vender para um contribuinte com inscrição Inapta. Isto é a morte de qualquer empresa, obviamente. E tudo isto, repita-se, por conta da boa-fé de declarar uma dívida tributária e não pagar. Empresário que fielmente apresenta declaração ao Fisco e simplesmente não recolhe o ICMS, no prazo regulamentar, não comete crime algum. Tal circunstância, nem mesmo em tese, segundo firme orientação do STJ, sequer acarretaria a responsabilidade dos sócios pela dívida fiscal da empresa (Súmula nº430). Para o STJ é inviável o redirecionamento da execução fiscal para os sócios na hipótese de simples falta de pagamento do tributo. Se a dívida confessada e não paga pela empresa nem pode ser cobrada de seus sócios, como é que o Fisco Baiano chega ao absurdo de “cassar” a inscrição estadual destes inadimplentes? Quanta desproporção!!! O crime quem comete é aquele que dolosamente ocultar do Fisco fato relevante para o surgimento da obrigação tributária. Criminoso pode ser aquele que, ao contrário do que declara, omite declarações que tinha o dever legal de fazer, que adultera escrita contábil, que emite “notas frias” etc. Esta odiosa criminalização da conduta de declarar tributo e não conseguir pagar é uma inversão de valores, configurando um quadro de verdadeira patologia fiscal, que muitos chamam de “manicômio tributário”. É o Estado valendo-se da força como um meio indireto de cobrança do tributo. Coitado dos contribuintes!!! Até quando???

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